Mulheres Sudanesas

Henna, véus e simpatia. Esses são alguns dos elementos mais comuns às mulheres sudanesas. Desde que cheguei a Cartum, a minha curiosidade sobre a vida e o mundo delas só faz aumentar.

Elas se pintam de henna. Fazem tribais e outros desenhos nas mãos e nas unhas, como forma de mostrar que se sentem amadas.

Elas usam véus coloridos. Algumas até exageram nas lantejolas e nos sapatos paramentados, mas o fato é que são muito enfeitadas e vaidosas. Cada ocasião demanda uma forma diferente de amarrar o véu, bem como um material e um estilo de véu diferente.

Elas são simpáticas. Sempre me trataram com grande amabilidade; acontece até de desconhecidas, do nada, me cumprimentarem na rua. Algumas chegam a mandar beijinhos. Isso não acontece com meus colegas homens da embaixada, nem com meu marido (ainda bem, pois sou ciumenta), mas acontece comigo. Eu respondo com um sorriso e dou tchauzinho.

Vejo que desperto nelas a mesma curiosidade que elas despertam em mim. Talvez em nossas cabeças femininas surjam os mesmos questionamentos: “será que essa roupa que ela está usando é confortável?”; “como será que amarra isso?”; “que detalhe interessante/engenhoso/esquisito…”.

Outro dia, em uma fila no aerorporto, uma senhora inteiramente coberta de preto me olhava atentamente. Provavelmente, não era sudanesa, pois as sudanesas são coloridas e deixam o rosto à mostra. Percebi que me olhava pela inclinação da cabeça. Observando melhor, dei-me conta de que não apenas ela, mas quase todas as mulheres da fila fitavam-me com maior ou menor discrição. Em suma, a “exótica” ali era eu, com meu terninho, minha pele branca e meus cabelos revoltos.

Em outro plano, tento entender a naturalidade com que uma delas me disse que seria normal o marido ter outras esposas (o Islã permite ao homem até quatro esposas, caso possa sustentar). “E se o Danilo quisesse ter uma segunda esposa, você impediria?”. “O quê? Jamais aceitaria isso!”, respondi indignada. “Quanta possessividade. Pode ser importante para a família. Seus filhos teriam mais irmãos!”. Bem, estamos em culturas diferentes e cabe-me apenas calar e respeitar.

Mas, justamente para quebrar de vez os estereótipos, foi de um homem muçulmano que ouvi a defesa mais bonita da monogamia. “Eu amo a minha esposa. Não teria como explicar aos meus filhos o que a mãe deles tem de errado para eu procurar outra.”

Aliás, estar em Cartum implica reavaliar estereótipos todos os dias. Nós, ocidentais, estamos acostumados a pensar nas mulheres de véus como infelizes e desempoderadas. Esse pensamento não é necessariamente mentira nem verdade, depende das circunstâncias. Aqui, há mulheres reitoras, deputadas (compõem expressivos 25% do parlamento), empresárias, diplomatas, etc. Com sua henna, seus véus e sua simpatia, muitas estão vencendo as barreiras de uma sociedade conservadora e abrindo espaços de poder e liderança.

Como, de resto, nós, mulheres brasileiras, tambem estamos fazendo no Brasil.

Sobre Márcia Canário

Diplomata brasileira servindo em Cartum.
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4 respostas para Mulheres Sudanesas

  1. Cristina Rafaela disse:

    Interessante!! Me disseram que as senegalesas, alem de belas, são também muito vaidosas!

  2. Rafael Frerichs disse:

    Márcia, como bom patriota, sinto-me honrado em estarmos tão bem representados com vc aí em Cartum. Uma curiosidade: qual a pior e a melhor coisa em morar na África? Abs.

  3. Bianca Abreu disse:

    Excelente! Vamos publicar no http://www.mulheresnopoder.com.br?

  4. Viviane Rios Balbino disse:

    Bravo, Marcinha!!!! Tô adorando suas crônicas e esta em particular. Beijão.

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